O ano é 2013 e o filme “O Homem de Aço” chega aos cinemas apresentando o Superman de Henry Cavill ao mundo. Em 2016, Batman vs. Superman chega às telonas, consolidando (?) a ideia de um universo compartilhado da DC Filmes longamente aguardado pelos fãs da editora. Avançamos no tempo para 2022 e nada disso saiu do papel, pelo menos não como originalmente planejado.
Nesse meio tempo muita coisa aconteceu: filmes mal-recebidos pela crítica, a saída de Zack Snyder, as denúncias contra Joss Whedon, o movimento #ReleaseTheSnyderCut, o lançamento do SnyderCut, filmes anunciados e realizados, filmes anunciados e cancelados, a compra da Time Warner pela AT&T e, mais recentemente, a fusão da WarnerMedia (ex-Time Warner) com a Discovery. Provavelmente aconteceram mais coisas nesse ínterim que acabei esquecendo de mencionar, mas a ideia aqui é apenas demonstrar que a vida do DCnauta tem sido uma montanha-russa de emoções e, verdade seja dita, nesse tempo todo ninguém era capaz de dizer o que o futuro reservava.
O acontecimento mais recente, entretanto, tem mostrado uma série de movimentos do novo CEO da Warner Bros. Discovery, David Zaslav, que demonstram que ele pretende dar à DC Filmes a atenção necessária para que as produções alcancem o sucesso e a repercussão que merecem. Não estranhamente o novo mandatário tem sido bastante ativo em suas declarações e as falas sobre as produções da DC bastante frequentes. Aliás, o fato de o CEO estar se manifestando com tamanha frequência é um fato positivo, visto que a comunicação sobre os rumos do universo DC dos cinemas sempre foi claudicante.
O primeiro e mais relevante movimento é a intenção de se criar um estúdio independente para as produções da DC Filmes, de nome ainda não definido. Essa ideia, um tanto quanto óbvia dado o inegável sucesso de seu principal concorrente, é um primeiro passo importante para se conseguir construir um universo (ou multiverso) minimamente coeso.
A Warner Bros. é um estúdio gigante, que lida com centenas de produções para diferentes mídias todos os anos, seja TV, cinema ou, mais recentemente, o streaming. Separar os times criativos e produtores em um estúdio independente dará maior celeridade aos processos e tornará as atenções desses times voltadas exclusivamente às produções da DC Filmes. Além disso, permitirá que equipes menores estejam envolvidas com os projetos, o que tende a diminuir as chances de vazamentos maldosos e frequentemente mentirosos que sempre tentam colocar em dúvida a qualidade das futuras produções da DC.
Entretanto, a burocracia de se criar um estúdio independente é a parte mais fácil. Superada essa etapa, a Warner Bros. Discovery tem a grande missão de encontrar a pessoa adequada para comandar a empreitada, e aí que está o busílis.
Diversas fontes na imprensa que cobrem o entretenimento têm relatado que Zaslav e sua equipe estão envidando todos os esforços para encontrar o seu “Kevin Feige”, o que é uma tarefa mais fácil de anunciar do que de executar. Penso eu, quase impossível. Não digo isso por entender que o chefão do Marvel Studios seja genial ou isento de críticas, mas é inegável que ele reúne uma série de qualidades, habilidades e experiência que dificilmente conseguirão encontrar em uma única pessoa. Listo algumas delas a seguir:
1) Para começo de conversa, Feige é um grande nerd e profundo conhecedor dos confins do universo dos quadrinhos, uma qualidade essencial a qualquer um que se proponha a essa tarefa.
2) Possui longa experiência nos bastidores desse tipo de superprodução, tendo começado na base e escalado em sua carreira até chegar no topo onde se encontra.
3) Sabe transitar entre os executivos, uma tarefa quase política. Essas produções envolvem investimentos muito elevados e, no fim do dia, o que importa aos acionistas é o lucro. Dessa forma, é necessário alguém que seja capaz de resistir às pressões criativas com possíveis recepções negativas das produções, mantendo a continuidade de execução do planejamento.
4) Ele tem grande poder nas mãos, mas nem sempre foi assim. Durante muito tempo houve uma separação clara entre a Marvel Cinema e a Marvel TV, que ficava sob o comando de Ike Perlmutter. Um dos entreveros mais famosos entre Feige e Perlmutter está nos Inumanos, originalmente previstos para protagonizarem um filme no MCU mas que acabaram ganhando uma (horrorosa) série de TV, o que acabou fazendo com que Perlmutter perdesse muita força dentro da Marvel e que Feige passasse a ser a mente criativa por trás de todas as produções.
As informações mais recentes dão conta de que o atual favorito para assumir a cabeça do novo estúdio como uma espécie de “conselheiro” seria Todd Phillips, diretor do estrondoso sucesso de bilheteria e crítica, Coringa. As qualidades de Phillips como diretor e produtor são inegáveis, mas como tentei demonstrar, assumir a tarefa de comandar o novo estúdio vai demandar dele mais do que “apenas” isso.
Ademais já houve na DC Filmes a tentativa de utilizar um diretor como arquiteto de seu universo compartilhado, na experiência não tão bem-sucedida com Zack Snyder. É verdade que à época foi escolhida uma pessoa com uma visão muito particular sobre super-heróis. É também verdade que não foi dada a ele uma estrutura independente indispensável para que se tenha sucesso.
Fato é que a ideia de se criar um estúdio independente ainda se encontra em estágio embrionário e ninguém é capaz de dizer se Phillips de fato será o escolhido para encabeçar a empreitada. Em sendo, também não é possível dizer se haverá sucesso ou fracasso em seus esforços, mas continuo achando que o melhor a fazer seria diluir esse poder na mão de uma equipe que reunida possuísse todos os atributos necessários.
A única coisa que é possível dizer é que, pela primeira vez em muito tempo, percebe-se uma tentativa verdadeira de se dar às produções da DC Filmes a atenção que merecem, e a criação de um estúdio independente para isso é um primeiro e tímido passo na direção correta.