A Bela Casa no Lago, escrita por James Tynion IV com a arte de Álvaro Martínez Bueno e o belo trabalho da colorista Jordie Bellaire, é uma história de terror dividida em 12 partes que explora a dinâmica de um grupo de amigos e conhecidos após um trágico evento.
Imagine abrir seu e-mail e receber um convite de seu amigo – ou conhecido com quem você não tem contato há um bom tempo – para passar uma semana em uma bela casa no lago. Ele explica que faz muito tempo em que vocês (incluindo aqui pelo menos 12 pessoas) não se veem, especialmente aqueles que estão morando em outro estado. Ele deixa claro que sabe sobre os planos de vocês para este verão, por isso encontrou uma data perfeita que encaixa na agenda de todos. Algumas fotos da casa foram anexadas no e-mail e sim, a bela casa no lago é extraordinária! Você recusaria esse convite inusitado?
Se você confirmou sua presença, Walter (seu amigo generoso) te enviará outro e-mail explicando como chegar até a casa a partir do aeroporto, é simples! De qualquer forma, ele enviará um motorista para te buscar. No segundo e-mail veio anexado mapas da casa e do terreno, para você se sentir familiarizado quando chegar lá. Ele não fala quais outros amigos estarão lá, mas te deu um codinome – baseado na sua profissão ou qualidade, com um símbolo te representando.
Esse símbolo estará em atividades, comida ou produtos que serão exclusivos para você. Ele não fala quem ficará no mesmo quarto que você, mas garante que vocês se conhecem e se dão bem. Parece que Walter planejou tudo nos mínimos detalhes e essa semana na bela casa no lago tem tudo para ser relaxante e memorável.
James Tynion IV é conhecido por seu trabalho na DC comics escrevendo histórias do Batman, e vem ganhando destaque por seus trabalhos no gênero de terror. E o que mais seria aterrorizante do que ver o mundo chegando ao fim? A Bela Casa no Lago foi lançada em junho de 2021 – quando a COVID já estava dando sinais de trégua, mas a doença deixou um alerta: nossa sociedade não está preparada. Cada capítulo explora a perspectiva de um membro do grupo em relação ao presente e aos eventos do passado que o fez estar em um refúgio isolado do resto do mundo.
O escritor trouxe elementos para a narrativa que ajudam na fluidez da história da bela casa no lago. Por exemplo, o e-mail com o convite para essa semana supostamente paradisíaca é uma página do quadrinho. Isso coloca o leitor como se fosse ele mesmo quem estivesse recebendo o convite, é como fazer parte da história. Se um personagem viu algo no celular que o assustou, na próxima página também podemos ver os posts e fotos no twitter. Em vez de fazer o personagem descrever o que viu, a história se desenvolve melhor quando vemos o mesmo que ele.
Outro ponto chave para a naturalidade narrativa é como Tynion não perde tempo com a introdução de personagens. A cada novo convidado que aparece na casa existe um balão com um breve resumo da vida de cada um, assim como o símbolo e codinome dados por Walter. No passar dos capítulos vimos que até esse modo de introdução se encaixa na proposta da história.
A Bela Casa no Lago explora o terror utilizando as cores. Para aqueles não familiarizados com a psicologia das cores, e existe um conceito sobre a aplicação das cores se conectando ao comportamento humano. Bellaire fez um ótimo trabalho ao complementar a indução dos sentimentos nas páginas abusando da predominância das cores. Em cenas de vivência, do cotidiano, a colorista utiliza paletas próximos da realidade, incluindo como a iluminação interfere no ambiente. Se o pôr do sol modifica os tons dentro de casa ou uma lâmpada do lado de fora da casa não seria capaz de iluminar o quintal inteiro, Bellaire foi cuidadosa ao trazer esses detalhes em seu trabalho.
Enquanto em cenas mais críticas, onde a emoção dos personagens está exposta da forma mais dramática possível, ela buscou cores condizentes com a situação e aplicou em tudo. Um belo exemplo está no capítulo 1, quando o grupo está apreensivo assistindo as notícias na televisão. Apesar de ser noite e o conteúdo do que eles estão assistindo lançar a cor azul no ambiente, é a exatamente a reação ao que o grupo está vendo na tela que grita azul: Impotência, tristeza, remorso. Essas emoções são representadas pelo azul e exatamente o que se passa naquele momento.
Outro exemplo da cor auxiliando as emoções é a predominância do laranja e amarelo no início dos capítulos. O personagem destaque do capítulo sempre começa em um cenário onde essas duas cores estão em evidência (com um contexto revelado no meio da história), explicando como Walter entrou em sua vida. É um ponto de interesse do leitor saber sobre o amigo excêntrico que os colocou naquela situação, e como o modo com que os personagens falam criam uma certa antecipação para saber o que aconteceu dentro da bela casa no lago. Tudo em torno de Walter, a alegria dele, era confortável estar com ele e os amigos não entendiam como ele foi desonesto a vida toda, os traindo daquele jeito.
A arte de Álvaro Martínez Bueno não fica para trás no quesito qualidade. Os incríveis cenários mostrando a casa, os detalhes dentro e em volta dela. O cuidado em criar uma cena, preencher os espaços, criar movimento. O artista não poupa detalhes em seus desenhos. Ele traz a personalidade dos personagens pelo estilo de roupa que usam, pela expressão corporal desenhada. Porém, o que mais se destaca na arte é o realismo nas expressões faciais. Da para saber, dá para sentir o que o personagem está vivenciando. O trabalho com as cores não seria possível sem uma arte perfeita.
Se minhas palavras não são o suficiente para aclamar A Bela Casa no Lago, que tal uma indicação ao Eisner Awards 2022? A história de terror da DC Black Label está concorrendo na categoria Melhor Nova Série na premiação mais importante dos quadrinhos!