Olá Terraversers! Na semana passada, lançamos uma enquete na nossa página do Facebook para decidir sobre qual projeto cinematográfico cancelado vocês gostariam de ler primeiro. A competição era entre o Batman: Ano Um de Darren Aronofsky e Liga da Justiça Mortal, de George Miller. Ambos projetos muito interessantes, que por bem ou por mal, não chegaram às telonas. O vencedor foi o filme do morcego, porém em breve retornaremos para falar sobre Liga da Justiça Mortal.
Batman Ano Um – Darren Aronofsky
Após o tremendo fracasso de público e crítica que foi Batman e Robin, de 1997, o personagem passou a ser visto com desconfiança pelos olhos dos produtores de Hollywood. Como bem sabemos, o prestígio foi recuperado 8 anos depois, com o reboot Batman Begins, de Christopher Nolan. Porém, nesse meio tempo não faltaram tentativas de levar o homem morcego novamente às telas. O próprio Joel Schumacher planejava uma sequência para Batman e Robin, chamado “Batman Unchained” (algo como Batman Desacorrentado). Joss Whedon também escreveu um roteiro rejeitado, e haviam até boatos de que a Warner gostaria de adaptar o sucesso Batman do Futuro para os cinemas. Porém o projeto que se destacou no período por suas grandes diferenças foi Batman Ano Um, de Darren Aronofsky.
Para quem conhece os trabalhos do diretor Darren Aronofsky, deve ser díficil imaginar um filme de super-heróis sob seu comando, visto que seus filmes são sempre considerados pontos fora da curva, não apenas pela aclamação da crítica, mas também pelo surrealismo e por vezes algumas cenas perturbadoras. Dentre suas obras mais conhecidas estão Pi (1998), Requiem para Um Sonho (2000), Cisne Negro (2010) e Mãe (2017). Muitos destes filmes foram polêmicos, seja pelo citado surrealismo ou pela grande divisão de opiniões, como foi o caso do filme “Mãe!”. Considerado por muitos um dos grandes filmes do ano, foi totalmente esnobado por outros e inclusive pelas grandes premiações (foi até indicado pro famigerado Framboesa de Ouro).
Dito isso, seu Batman Ano Um quase aconteceu. Antes, Aronofsky tentou adaptar Ronin, de Frank Miller, e “Cavaleiro das Trevas”, do mesmo autor, considerando Clint Eastwood para o papel do Batman aposentado. Após o engavetamento desta ideia, Batman Ano Um começou a ganhar forma. O filme seria produzido por Eric Watson, antigo parceiro de Aronofsky em PI, e baseado em partes na HQ homônima, escrita também por Frank Miller, e teria participação do mesmo na roteirização do filme. Porém, as similaridades se reteriam à relativamente poucas coisas: elementos como o assassinato dos pais, personagens como o tenente James Gordon e Selina Kyle apareceriam, além das dúvidas, erros e angústias de um Bruce Wayne inexperiente. Porém o grande destaque do filme eram as grandes diferenças entre este e qualquer outro material publicado em outras mídias. A história seguiria uma linha muito próxima à Taxi Driver, com o clima de gangster de “French Connection”, além de ser um projeto de orçamento mais baixo do que o habitual para projetos de super-heróis.
A história
Após as mortes de seus pais, Bruce Wayne perderia toda a sua fortuna e passaria a viver nas ruas. Ao invés de Alfred, o mordomo, teríamos “Little Al” (Pequeno Al), um rapaz afrodescendente dono de uma oficina de automóveis, herdada de seu pai Big Al. Little Al cuidaria de Bruce após sua ida para as ruas, e se tornaria o mentor e figura paterna do mesmo.
Nesta versão, Bruce não viajaria pelo mundo para treinar as mais diversas artes físicas e mentais. Ele permaneceria em Gotham e treinaria sozinho, lendo livros sobre vários tipos de combate.
Enquanto ele cresce ao lado do povo mais pobre e sofrido de Gotham, dentro dele também cresce cada vez mais uma fúria contra toda a sujeira e corrupção que estavam à sua volta, com isso o motivando a virar o Batman. Little Al tenta convencer Bruce a ter uma vida social, talvez arranjar uma namorada, tentando fazê-lo viver de fato, porém sem sucesso. Bruce fica cada vez mais emocionalmente perturbado.
Nota-se que não é um simples senso por justiça igual às outras versões do personagem, mas sim uma motivação muito mais vingativa, algo próximo ao anti-herói Justiceiro, onde ele busca algo para canalizar a sua raiva. O filme provavelmente seria mais obscuro do que as versões de Snyder e Nolan que vimos recentemente, mesmo essas já sendo apontadas como versões “dark” (nada menos do que um reflexo das HQs dos anos 80 pra cá – com grandíssima influência de Frank Miller, incluvise).
Em um certo ponto do filme, Gordon apareceria na TV declarando uma guerra sem precedentes ao mundo do crime, o que inspiraria Bruce à iniciar a sua carreira de vigilante. Gordon, que assim como na HQ, parece ser um dos poucos não-corruptos de Gotham, aqui é retratado como um policial com tendências suicidas que há muito vive em Gotham, porém que quer deixar a cidade para o bem de sua esposa Ann, que está grávida. Enquanto isso, na HQ original tínhamos um Gordon que acabara de chegar à cidade.
Em sua longa cruzada contra o crime, Bruce conheceria Selina Kyle. Aqui, ela seria uma prostituta que acaba sendo salva por Bruce de um estupro por parte de seu cafetão. Falando em inimigos, os mafiosos seriam o foco do longa, com Falcone sendo substituído por Gillain B.Loeb, que além de comissário de polícia, seria o grande chefão do crime de Gotham.
Um ponto interessante na história é que Bruce passaria de um vigilante comum para Batman em circunstâncias diferentes do usual. Bruce herdara do seu pai dois anéis, com as iniciais de seu nome: T e W (Thomas Wayne). Assim, quando esmurrava criminosos, o “TW” ficava marcado em suas peles, o que acabou sendo com o tempo confundido com um símbolo de morcego. Os criminosos marcados com o símbolo do Batman foram recorrentes na última encarnação do Batman, em Batman vs Superman.
Ao final do longa, Batman derrotaria a máfia e recuperaria sua fortuna. Um gancho para um segundo filme seria feito, com o agora comissário Gordon não conseguindo a transferência de Gotham, e sendo obrigado a assumir o caso do vigilante Batman. Ao consultar alguns psicólogos no asilo Arkham, ele passaria pela sela do Coringa, e trocaria algumas palavras com o promotor Harvey Dent.
O batmóvel deste versão seria um carro muito menos espalhafatoso do que os batmóveis aos quais estamos acostumados – seria um Lincoln Continental, levemente modificado por Al em sua oficina. A batcaverna seria uma estação de metrô abandonada. O combate de Bruce contra os inimigos seria brutal, realista e com seus “gadgets” menos modernos e mais na base do improviso. Também é citado que ele usaria armas químicas.
Citações do longa em entrevistas
Um exemplo de como o filme seria pesado foi dado pelo próprio Frank Miller em uma entrevista ao Hollywood Reporter em 2016. Nas palavras dele:
“Foi a primeira vez que trabalhei em um projeto do Batman com alguém cuja visão do Batman era mais sombria que a minha. Meu Batman era bom demais para ele. Nós discutíamos sobre isso, e eu dizia: “Batman não faria isso, ele não torturaria ninguém”, e assim por diante. Fizemos um roteiro e fomos maravilhosamente recompensados, mas a Warner Bros. leu e disse: “Não queremos fazer esse filme”. O executivo queria fazer um Batman para o qual ele pudesse levar seus filhos. E isso não era assim. Não tinha os brinquedos nele. O Batmóvel era apenas um carro modificado. E Batman deu as costas à sua fortuna para viver uma vida de rua para que ele pudesse saber o que as pessoas estavam passando. Ele construiu sua própria Batcaverna em uma parte abandonada do metrô. E ele criou o Batman com roupas completas para combater o crime e uma força policial corrupta.”
Miller, conforme acima, apontou que apesar das diferenças criativas entre ele e Aronofsky, eles entregaram uma versão do roteiro à Warner, mas o projeto foi vetado por um produtor executivo que gostaria de ver algo mais “família” nos cinemas. Porém, outro ponto que influenciou o estúdio à não seguir em frente, segundo o jornalista Glen Weldon (autor de The Caped Crusade: Batman and the Rise of Nerd Culture), foi uma opinião negativa no site Ain’t It Cool News, que dizia ter tido acesso ao roteiro. O estúdio negou que a cópia que o site leu era a verdadeira, mas o estrago já estava feito.
Em uma entrevista ao Yahoo, Darren Aronosky afirmou que à despeito de cogitações de Christian Bale para o papel de Batman em seu longa, ele sempre quis Joaquin Phoenix para o papel. Ironicamente, ambos assumiram papel de Batman e Coringa em franquias subsequentes no cinema.
Além disso, o diretor afirmou que vê muito do seu filme cancelado no futuro filme do Coringa com Joaquin Phoenix. Nas palavras dele:
“Você sabe o que, eu acho que é finalmente a hora… Eu acho que nós estávamos basicamente 15 anos antes da hora. Porque eu escuto o jeito que eles estão falando sobre o filme do Coringa e é exatamente isso – era como eu queria: vamos filmar no leste de Detroit e no leste de Nova York. Não estamos construindo Gotham. O Batmóvel – eu queria que fosse um Lincoln Continental com dois motores de ônibus.”
Aronofsky ainda acrescentou que alguns elementos de sua versão acabaram chegando às telas através de outros projetos, particularmente a supracitada marca de Batman nos bandidos em BVS, de Zack Snyder:
“Algumas de minhas idéias saíram em outros filmes. Como o anel com “BW”, o anel de Bruce Wayne fazendo a cicatriz foi nossa idéia e eu acho que Zack utilizou ela ou algo assim.”
O que nos resta agora é a eterna curiosidade sobre um projeto que parecia muito promissor e interessante. No primeiro parágrafo, dissemos que o projeto não saiu “por bem ou por mal”, pois o cancelamento do mesmo nos permitiu ver a aclamada versão de Christopher Nolan para o personagem.
Nos vemos em breve para falar sobre outro projeto cancelado que atiça muito a curiosidade dos fãs – Liga da Justiça Mortal, de George Miller.