Lançada em 1990, Os Livros da Magia foi uma série originalmente lançada em quatro edições escritas por Neil Gaiman. Após a conclusão dessa minissérie houve uma nova saga escrita por Peter Gross, além da aparição do personagem principal em outras HQs como Liga da Justiça Sombria e atualmente retorna aos quadrinhos em Sandman Universe. Aqui falaremos sobre a saga escrita por Gaiman, o início da jornada do herói.
Timothy Hunter é um garoto comum de treze anos, com roupas simples e skate maneiro rodando pelas ruas. Até ser abordado pela Brigada dos Encapotados e ser convidado a uma jornada que irá mudar sua forma de ver o mundo e principalmente seu destino.
Tim está destinado a se tornar o Mago Supremo e isso coloca sua cabeça a prêmio, e as coisas que ele irá ver e experimentar nos momentos que se seguem, podem ser maravilhosos e perturbadores. A série escrita por Gaiman é dividida em quatro volumes, e em cada um deles, um mago guia Tim por um caminho diferente. Presente, passado, futuro e os mundos além. Os “guias” são da Brigada dos Encapotados, que aparece pela primeira vez nessa hq. Vingador Fantasma, Doutor Oculto, John Constantine e Mister Io. Após sua aparição em Livros da Magia o grupo recebeu uma minissérie em duas edições. de mesmo nome pela Vertigo.
Gaimam deixa sua assinatura destacada nessa obra, além de todo o estilo da narrativa próprio do escritor, vemos locais ilustrados em suas obras aqui novamente. Do mundo das Fadas ao Sonhar até o fim dos tempos onde Destino fecha seu livro e Morte apaga as luzes e fecha a porta.
O início da jornada é como um tour pelo passado. Em Livro I: O Labirinto Invisível, somos, juntamente com Timothy, apresentados ao início das eras, a queda dos anjos, arcanjos poderosos que pairam sobre o firmamento, ao declínio de sociedades tragadas pelas ondas, “um museu de fantasmas, a ascensão de efêmeros impérios, que brilham e logo se apagam”. Talvez uma das presenças mais ilustres desse trajeto seja Merlin que revela seu fim e que não fará nada para alterá-lo, pois “a magia não confere liberdade” (sugiro aos leitores foco nesses dizeres), a caminhada segue para eras mais atuais, o extermínio de mulheres consideradas bruxas é ilustrado em gravuras que remetem as ilustrações de livros antigos. Algo muito propício para nossa realidade é dita pelo Vingador Fantasma, “as pessoas matam o que temem”, é algo bem reflexivo e universal que Gaiman em sua sabedoria incluiu nessa leitura, afinal parece que os tempos mudam e o homem segue a rotina de expurgar aquilo que lhe causa temor ou estranheza, antigamente eram as bruxas, e hoje?
No capítulo que se segue Livro II: O Mundo das Sombras, viajamos com John Constantine para Nova Iorque, Tim não entende como chegou no avião, Constantine agindo da forma sacana habitual, apresentará algumas pessoas muito importantes no universo místico da DC para o jovem mago, começando com Madame Xanadu, ela lê as cartas de Timothy que sem surpresa tirou quatro arcanos maiores e a leitura das cartas claramente se referem aos seus guias da Brigada dos Encapotados, porém há algo mais, um aviso de ameaça iminente, que logo vemos os perigos que esperam o menino, faz parecer que a cada passo há uma armadilha pronta para pega-lo, mas esses mesmos passos possibilitam novas experiências e a conhecer ícones da magia, como o Senhor Destino e Zatanna. A arte que ilustra esse capítulo é de Scott Hampton, a aquarela e consegue passar toda uma sensação de devaneio e um clima conturbado que faz você sentir quando há perigo e talvez até uma leve dica de em quem você pode confiar.
Talvez Doutor Oculto seja o guia mais amigável, ele nos levará para o A terra do crepúsculo de verão, título do Livro III, lugar que quem acompanha Sandman já viu, muitas regras envolvem esse lugar, boa parte delas são regras de etiqueta, mas que podem garantir sua saída em segurança. Avaliando tudo o que acontece, toda a estética, ambiente, personagens fazem parecer que Timothy entrou em um jogo de RPG, e as ações e reações parecem ser decididas na sorte.
Mesmo com o zelo do guia é difícil não entrar em alguma confusão, mas parece que a sorte está do lado de Tim.
Mister Io é o último guia dessa jornada, mostrará o futuro a Tim, ou uma das possibilidades dele. É um futuro cruel, e vemos conflitos internos surgindo em Timothy, será que esse é realmente seu futuro e ele não pode fazer nada para mudá-lo? Afinal a magia não confere liberdade.
Mister Io mostra o que acredita que o futuro Mago Supremo deveria ver, conta a história de como ficou cego, e continua o guiando até futuros inimagináveis, que se avaliarmos são possíveis, um futuro onde a tecnologia e a magia são uma coisa só, seres humanos que se adaptaram ao ambiente insalubre e já não se parecem com homens ou mulheres. Já estavam tão distantes no tempo que já não restava nada, Destino, sim aquele Destino está prestes a fechar seu livro e Timothy e Mister Io estão lá para presenciar. E é um ambiente propício para impedir que o garoto se torne o Mago Supremo.
Mister Io é um personagem que em uma carga extremista, ele acredita que o bem deve se sobrepor ao mal, não se preocupa com o equilíbrio. Sai do papel de guia e toma para si o papel de executor. Alguém que conhece tão bem o futuro e sabe que ele está me mudança não deveria acreditar na liberdade de escolha?
Por mais irônico que seja quem salva Timothy Hunter da morte é a… Própria Morte.
Livros da Magia nos permite perambular por universos, conhecer personagens, passear pelo tempo e espaço. Quem acompanha as obras de Neil Gaiman, especialmente Sandman, já está familiarizado com muitos dos personagens que aparecem na história, é sempre um prazer ver um personagem visitando o Sonhar e a forma que Oneiros interage com quem aparece desperto por lá.
Gaiman consegue inserir diversidade de personagens sem os fazerem passar despercebidos, todos tem uma função uma importância que enriquece a leitura e aguça a curiosidade para conhecer ainda mais os Magos do Universo DC. E brincar com a casualidade, como uma carona de Terrence Thirteen, nos faz querer prestar atenção no nome de cada personagem e procurar conhecer aqueles que não sabemos quem são.
É como brincar com o leitor para testar o quanto estamos atentos.
São momentos de tensão misturados com delicadeza e beleza próprias do autor, talvez a mais terna seja a Ioiô. Transformar um brinquedo em uma coruja, dar uma alma e fazer dele guardião e companheiro de um menino que parecia sozinho e totalmente perdido.
Em paralelo vemos algumas críticas sociais, a corrupção pelo poder, ou o controle que o poder tem sobre quem o detém. Merlin não poderia simplesmente mudar seu futuro em vez de aceitar uma morte horrível? Será que Timothy Hunter tem o mesmo destino? O bem sempre deve triunfar sobre o mal ou coisas más devem acontecer para que o equilíbrio se mantenha? Mister Io sabia uma possibilidade de futuro, o poder que aguardava Tim Hunter, matá-lo seria a melhor opção ou devemos acreditar que ele seguiria um caminho correto na magia?
No fim resta a Timothy Hunter escolher o caminho a seguir. O poder da escolha talvez seja o maior que se possa ter.