Ano passado, fizemos um post explicando alguns motivos para assistir Raio Negro, onde a questão central do texto tratava-se de representatividade e visibilidade de pautas sociais importantes. Em síntese, falamos que a série apresenta em seu enredo algumas formas de alertar seu público para as questões que envolvem o racismo e a discriminação, principalmente quando diz respeito à violência e vulnerabilidade social enfrentada pela população negra.
Apesar de estarmos falando de um super-herói com poderes elétricos, devemos sempre lembrar que estas histórias são baseadas em algo anterior, as HQs, sendo estas uma espécie de expressão artística e como arte, além de entreter, elas têm a função de estimular o debate e o diálogo de pautas importantes. É como eu sempre digo: “nunca é só uma história” ou “nunca é só uma série”.
O personagem Jefferson Pierce, desde sua criação nos provoca a pensar sobre alguns pontos, e sua série no canal The CW, durante suas três temporadas trouxe algumas cenas e diálogos que merecem atenção e até mesmo voltar um pouco para re-assistir.
Falando um pouco sobre as personagens da série, em um primeiro momento gostaria de citar a DOUTORA Lynn Stewart (Christine Adams), saliento a palavra doutora, porque imagino como é para uma menina negra vendo uma atriz negra, assim como ela, interpretando uma médica bem sucedida em sua profissão. Somente neste fato, incluo duas representações, a primeira, de ver uma atriz negra na televisão e a segunda, de sua personagem não atuar como vilã da história ou em um papel subalterno.
Assim como Dr.a Lynn, Anissa Pierce/Tormenta (Nafessa Williams), uma de suas filhas também adotou uma carreira na medicina, mas esta com um diferencial, sendo uma mulher LGBT. Assim, podemos ressaltar que ela rompe com algumas representações que estamos acostumados a ver, como por exemplo, o herói homem, branco e heterossexual. A criação de Anissa vai contra esta ideia e além disso, a personagem é uma ativista.
Já nos primeiros episódios da série, ela participou de um protesto, ocasionando sua prisão e após ser libertada por seu pai, ele a alerta dizendo para “tomar cuidado por ser uma mulher negra na América“.
Como disse anteriormente, Raio Negro chama o público a debater algumas questões e esta frase “tome cuidado por ser uma mulher negra na América“, estabelece que vivemos em uma sociedade racista e mesmo se Anissa não fosse uma ativista, ela já seria vista por olhares tortos pelo fato de ser uma mulher negra.
Outra filha de Lynn e Jefferson Pierce, Jeniffer/Rajada (China Anne McClain) é retratada como uma adolescente e tem as vivências de uma adolescente de qualquer série, como as questões amorosas, a vida escolar e a equipe de atletismo. Aqui, cito o fato de a personagem não ser “a amiga negra da protagonista”, muitas vezes inserida nas séries para cumprir uma cota. Jen, como é chamada, tem relevância na trama e claro, também é uma super-heroína poderosa.
Jefferson Pierce/ Raio Negro (Cress Williams) encarna um duplo papel na série, além de ser o super-herói de Freeland, ele atua como diretor da Garfield High School, tentando transformar a escola em um ambiente pacífico e seguro em meio às ameaças externas, sendo por vezes chamado de “Jesus Negro“. Em diversos momentos da série, o personagem de Cress nos provoca com algumas situações e diálogos, como por exemplo, o ocorrido no episódio 12 da segunda temporada, onde Jefferson tem uma conversa com seu substituto na direção da escola.
Apesar de o homem alegar que sua vida não era tão boa quanto Jefferson pensava, Pierce alega que por mais que sua infância tenha sido difícil, nenhum negro rico teria os mesmos privilégios que ele tem, apenas pelo fato de ser branco.
No episódio piloto, Jefferson é duramente abordado pela polícia, sendo suspeito de um assalto e ao perguntar a descrição do assaltante ele fala que certamente seria um homem negro bem-vestido dirigindo um carro de valor elevado com suas duas filhas. Esta cena, já nos primeiros minutos da série nos mostra que o tema racismo é bastante abordado na trama e o maior antagonista de Pierce, como trago no título desta matéria.
Raio Negro não nos apresenta uma simples série, afinal, como disse no início deste post: “nunca é somente uma série”. Por meio das histórias e vivências da família Pierce podemos identificar pontos como a violência física e simbólica enfrentada pela população, permeadas pelo racismo estrutural, que segrega a população, retirando oportunidades e empurrando-a para a criminalidade como forma de sobrevivência. A atuação de Jefferson como diretor da escola também deve ser mencionada, pois percebemos que para ele, além de todas vidas negras importarem, a educação sempre será a melhor arma contra as opressões.