Justice Con | Painel fala sobre diversidade nos filmes do diretor Zack Snyder

    Participantes do painel: Sheraz Farooqi, editor-chefe do site ComicBook, Jornalista do Hollywood Reporter; Jonita Davis, professora universitária, jornalista e crítica de cinema; Chris Wong-Swenson, repórter e youtuber.

    Apresentadora – Quando eu estava montando este painel, imediatamente pensei em vocês três. Tem tópicos que adoraria que vocês discutissem. Sheraz, você fez um trabalho incrível com Superman e sua história de imigrante. Por que não começamos por aí?

    Sheraz – Claro. Engraçado que “The Ultimate Immigrant Story” foi minha estreia, o primeiro artigo que escrevi, em 2017. Gostaria de começar agradecendo a todos que me apoiaram. Teve muito ódio quando escrevi isso. Quando se trata do Superman, o personagem sempre teve essa história de imigrante. Se você conhece o Superman, então você sabe que ele foi criado por dois filhos de imigrantes judeus. A palavra Kal-el é hebreu e mesmo em arábico, é uma palavra que significa amigo. Se você cresceu com os filmes do Christopher Reeve, você sabe que o Superman é tipo “Eu sou um amigo”. Superman tem esse senso de pertencimento, mas também ressoa com as pessoas que sentem que não pertencem. E acho que a próxima pergunta é “Como você leva isso para a tela?” E eu acho que Zack Snyder começou muito bem com Homem de Aço. A ideia de balancear entre diferentes culturas; a ideia de alguém que nasceu em uma cultura que não é familiar e crescer em uma cultura diferente. Então, qualquer um que esteja em duas culturas, como eu criado e nascido em Nova Iorque, mas que tem família no Paquistão. Então imediatamente você está dividido entre duas culturas, duas diferentes ideias. E achar onde você se encaixa nisso é meio que a jornada, não importa de onde você venha, todos tem uma jornada similar nesse sentido. Eu senti isso imediatamente com Superman, eu vi isso na tela. Eu pude ver o que estava acontecendo. O próprio Zack Snyder disse em entrevistas que o Superman era o Ultimate Imigrante, por isso que escolhi esse título. Quando vemos isso e avançamos para Batman vs Superman, é isso que eu sinto quando aquela história se torna a história sobre a sociedade, e o que a sociedade significa para as pessoas de cor, para as minorias. Agora temos Superman, o mesmo personagem que vimos em Homem de Aço, que encontra sua identidade e escolhe a Terra para lutar por ela, se sacrifica por ela ao matar Zod. Isso está estabelecido, é sua fundação.

    Agora em BvS, o que você vê? Você vê Batman vs Superman, e você precisa olhar de onde o Batman veio. Se você pegar a fala do Batman onde “Se houver 1% de chance de ele ser inimigo, então temos que encarar isso como certeza absoluta”, não é uma coincidência que essa é a fala exata que Dick Cheney [ex vice-presidente dos EUA] usou para invadir o Oriente Médio. Ele disse “Se tem 1% de chance de um terrorista atacar…” e vimos o que aconteceu, especialmente com os civis inocentes daquela região. Quem sabe isso pode alcançar esse vão entre Batman e Superman e dizer “Ok, Batman está tomando essa perspectiva”. Nós temos um Batman quebrado, não é quem deveria ser, ele foi desconstruído. Então o próximo passo é construir um histórico. Nós temos a cena da Martha, que divide opiniões, mas faz parte da cultura agora. É um tema muito simples, vocês têm a “mesma” mãe, o que isso significa? O alien se conectando com o humano. Eu achei isso muito interessante. Notei que ninguém estava escrevendo sobre isso, especialmente quando as criticas e reviews saíram. Na época eu não estava nessa área, eu trabalhava na parte financeira. Eu pensei “Por que ninguém está falando sobre isso?” Então eu comecei a escrever sobre isso, tive muitas conversas sobre isso. E Zack Snyder compartilhou ele no Vero, dizendo que era uma escrita linda e precisa.

    Chris – Posso falar algo? Quando li o artigo de Sheraz, isso foi o primeiro artigo que li que diz algo diferente, que ficou na minha mente. Eu sou um fã de Dragon Ball, e Goku e de certa forma… bem, ele não é japonês, ele é um alien! Nesse aspecto, quando Superman é uma raça diferente onde existe racismo, onde Batman olha de forma diferente, pensando que ele é perigoso. Tirando o aspecto dos quadrinhos, mergulhando em algo muito mais profundo, Superman se torna algo muito mais internacional. Porque não tem que ser só o jeito americano, todo mundo está procurando pelo Superman. Indianos, australianos, todos procuram por Superman como eles mesmo, tentando se aceitarem. Eu amo esse aspecto de se aprofundar ainda mais neste entendimento do personagem.

    Apresentadora – Acho que minha parte favorita no jeito que ele está sendo retratado recentemente é mostrar que Superman, se ele chegasse na Terra hoje, existiriam pessoas chamando ele de aberração e outras o chamando de Deus, similar ao filme.

    Jonita – Isso alcança a nossa mitologia. Superman está por aí há tanto tempo, nós sabemos a história de origem dele e existe a idealização da origem, é tipo a mitologia grega. O jeito que os deuses eram todos poderosos e ótimos, mas tem as histórias de quando eles visitam a Terra e são horríveis. Acho que meio que chegam ao mesmo lugar. Quando você tem um deus entre os humanos, o que acontecerá? Nem sempre será um domingo ensolarado tomando sorvete. Coisas aconteceriam porque é o jeito que nosso mundo é. É algo que nós não estamos preparados. Algumas pessoas irão agarrar essa mitologia e outras pessoas não serão capazes de fazer isso, porque elas não conseguem idealizar isso. Quando você cresce com pessoas te dizendo que tem certas coisas que você não pode fazer, certos lugares que você não pode ir, certas coisas que você não pode dizer ao redor de certas pessoas, você cresce com essas restrições. Eu não sei como a vida é sem essas restrições. Existe uma diferença enorme. Nós nem mesmo somos unidos, nós não nos damos bem, como conviver com um alien? Acho que as pessoas não ficariam confortáveis.

    Apresentadora – Sheraz, eu queria sua opinião para quando as pessoas pegam o trabalho do Zack e transformam em algo negativo, digamos racismo ou homofobia.

    Sheraz – A primeira coisa que vem na mente é a ignorância. Eu tento introduzir materiais de leitura para as pessoas. Eu encontro muitas pessoas que são contra os personagens, mas quando sento e explico as coisas, eles meio que entendem. Mas é claro que existem as causas perdidas, pessoas que não importa o que você fala, a pessoa sempre vai contra argumentar. Também existem pessoas que no geral não gostam do Zack Snyder e vem com uma noção pré-concebida. Nós vimos isso em Sucker Punch, em 300, vimos em BvS, chamando o Superman de fascista. E eu fico tipo “De onde você está tirando isso? Onde está esse contexto?”, se você vai falar algo, você precisa de contexto. Você também tem que aprender a ignorar algumas coisas, sempre existem os trolls e as pessoas que vão odiar as minorias só porque são as minorias.

    Chris – É frustrante quando você vê essas coisas negativas para algo que o Zac fez, ao meu ver, como positivo. Você vê inclusão, você vê mulheres poderosas. Quando eu vi Liga da Justiça, mesmo sendo Liga da Justiça dos cinemas [disse zombando], você vê as amazonas. E você vê tipo “Ela é asiática!”, mas ela é uma amazona. Você vê negras como amazona. Não são apenas uma cor. Então foi incrível, é algo que eu apoio.

    Apresentadora – Continuando no tópico sobre raça, queria Jonita falasse um pouco mais. Ela tem trabalhado com Ray Fisher, e também queria que falasse sobre o White Washing (embranquecimento) que vimos recentemente em Liga da Justiça.

    Jonita – Tudo que eu escrevi sobre o Ray, acho que ele falou e expandiu ainda mais ontem aqui na Justice Con. Ele fez muito melhor do que eu poderia fazer. Começando pelo White Whasing, eu na verdade não vi o filme Liga da Justiça. Eu vi as amazonas e achei muito diversificado. Geralmente é um grupo de garotas brancas correndo atrás da Mulher-Maravilha. Então quando você as vê [as amazonas no filme], você fica “Ok, eu sempre soube que poderia ter mias que garotas brancas”. Eu não estou realmente por dentro do grupo, mas alguns fãs me procuraram há um ano atrás, e falaram que eu precisava ver umas coisas. Foram coisas que o Zack divulgou e eu fiquei “Certo, esses são negros e eu não vi nada disso no filme”. Vi foto do Ray com os pais, Ray com a comunidade jogando futebol, todas essas pessoas em volta, essa diversidade. E eu fiquei “Para onde essas pessoas foram?”. Aí eu comecei a procurar e vi que todas essas pessoas foram deixadas de fora na versão do Whedon, e eu comecei a tentar saber o porquê. E aí eu cheguei até o Ray. Quando falei com ele, e ele disse que esse personagem Cyborg, um cara negro, era parte da história principal. E Zac sempre fala “Cyborg é o coração do filme” e isso era diferente. Nós não costumamos ver um personagem negro, ou marginalizado, como uma peça principal em um filme tão grande. Ray disse que eles conversaram, antes mesmo de fazer o roteiro, e que seria sobre esse personagem negro. Então por que esse personagem foi jogado para o escanteio nessa versão de Liga da Justiça? Ele deveria ser o filme inteiro.

    As pessoas deveriam ver o que ele significa. Crianças procuram a imagem do Cyborg como exemplo, porque ele é, de certa forma, deficiente e ele é negro. E a história dele é fenomenal. Mas o que teria acontecendo se ele estivesse no filme inteiro, sabe? Antes de Pantera Negra ter sido lançado. Eu sei que as pessoas ficam “Vocês têm a representatividade em Pantera Negra”, mas isso foi um ano antes. E nós poderíamos ter isso um ano antes. E o fato deles não terem fé nisso, ou qualquer que seja o motivo… Nós não estamos falando de apenas alguns cortes, foi a história toda desse personagem. Eu só estou pensando no garotinho vendo isso e dizendo “Racismo!”, porque é racismo. Pode falar para todo mundo, isso é racismo! Eu estou feliz por Ray estar falando sobre isso. Não é só sobre ele ser negro, ele também é deficiente. É sobre um personagem amputado que tem partes artificiais no corpo dele, quantas pessoas nesse país não são assim? São pessoas que tem algum tipo de trauma e precisam superar isso. Tinha tantas lições sobre isso. Minha frustação é essa, como isso ainda não é uma história importante?

    Apresentadora – Chris, você esteve por dentro dessa comunidade do Snyder Cut desde o início, especialmente no YouTube. Nos diga como essa comunidade realmente é e nos diga se ela é diversificada, por que existe essa história só tem gente branca.

    Chris – Acho que é muito diversificada. A principio você não sabe, porque é só um monte de nome, mas aí quando nos reunimos e fizemos um vídeo sobre o #ReleaseTheSnyderCut, você vê rostos diferentes, diferentes pessoas, diferentes sotaques e pensa “Isso é lindo!”, é um arco-íris de cultura que querem a Liga da Justiça de Zack Snyder. Todos sentem que existe um pouco deles ali. E acho que isso é maravilhoso de se ver. Você não costuma ver isso, é algo que marca pessoas de diferentes partes do mundo, de diferentes formas, mas elas amam igualmente. Acho que é algo mágico.

    Sheraz – Exatamente! Na Liga nós temos o Superman, mas também tem a Mulher Maravilha, o Aquaman, o Cyborg e cada um se enxerga em um deles. E não podemos falar apenas das pessoas que falam inglês. Nós vimos como o fandom é gigantesco no Brasil quando falamos da DC. A Warner recentemente percebeu isso, foi tipo “Espera um pouco! Esse continente enorme que estamos praticamente ignorando, estão obcecados com a DC Comics. Por que não alcançamos mais?” Aí você vê como foi com Mulher-Maravilha 1984 lá [na CCXP]. Você vê pessoas na Arábia Saudita, no Oriente Médio, que são obcecados com o Homem de Aço e querem o Snyder Cut. São pessoas de diferentes culturas querendo a mesma coisa, por isso é frustrante quando as pessoas são ignoradas. Nós somos os fãs. É aí que o racismo pode entrar, porque estamos apagando eles.

    “Zack Snyder’s Liga da Justiça” estreia no streaming HBO Max em 2021.

    Tradução: Rayanne Matos

     

    Willyan Bertotto
    Willyan Bertotto
    Publicitário. Diretor de Arte, Designer e Batmaníaco. Fã incondicional da DC Comics e pesquisador assíduo desse universo e todas as suas possibilidades de transformação.

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