Famosos pelas trapaças desastrosas na série de desenhos animados Corrida Maluca ou pela caça obsessiva e frustrada ao pombo Doodle, a dupla Dick Vigarista e Muttley está, dessa vez, fora dos televisores para ganharem vida em uma versão HQ.
O Tenente Coronel Atcherly e o Capitão Muller, ou Dick e Mutt, oficiais das Forças Aéreas dos EUA, iniciam a história em um voo de reconhecimento sobre o Improvaquistão, uma área completamente devastada após um malsucedido teste com um reator atômico alimentado pelo elemento raro Instabílio 239.
Durante a missão, entre uma acalorada discussão da dupla, afinal Mutt ousou levar a bordo seu gracioso cão vira-lata, encontram-se diante do misterioso drone P-MBO GUERREIRO, que daí em diante, ao disparar um gás radioativo na direção daquilo que encontra pela frente, começa a provocar o caos e uma completa instabilidade em todos os sentidos e instituições.
Como um ponto forte da HQ, toda sua liberdade e criatividade para expor um mundo que flerta com a falta de sentido, para isso o roteiro de Garth Ennis (Preacher, O Justiceiro) não poderia ser mais certeiro quando escolhe ter o ambiente principal da narrativa a política. Presidentes, senadores e outras figuras de poder que, em alguma parcela, já apresentam-se cartunescas e ideologicamente fora de qualquer razão que não apenas a sua própria, na HQ essas personalidades misturam-se com a nova realidade e tem seus discursos e ações realçados quando influenciadas por ela. O momento em que o Presidente dos EUA, em meio a um turbilhão, decide seguir sua agenda e promover o recital de harpa da sua filha no salão oval da Casa Branca é por si só uma boa dose de um realismo absurdo ou absurdo realismo que não deixa de se apresentar como uma referência.
Enquanto isso, Dick e Mutt seguem suas aventuras para se manterem vivos após a exposição ao gás radioativo, numa história que mistura ingredientes de espionagem, existencialismo, surpresas e um quebra-cabeça que vai se montando sobre o que realmente está acontecendo, a parcela de interesse do governo e as peças que se ligam ao misterioso Professor Dúbio, envolvido com o reator atômico e ligado ao efeitos do Instabílio 239.
Responsável pela arte da HQ, Mauricet (Arlequina) é preciso quando consegue chamar a atenção para os detalhes, seja nas respostas faciais sempre expressivas aos acontecimentos durante o desenvolvimento da história ou quando os personagens estão de alguma forma alterados. Os cenários também atuam, tudo muito bem construído, uma arte que funciona como alicerce para a leitura da narrativa. As cores de John Kalisz não se omitem, são fortes, vivas e belas na construção dos cenários, quadro a quadro o trabalho aparenta uma diversão para o profissional, não é menos para quem lê. Os extras com as capas variantes são presentes, destaque para a de Liam Sharp.
Dick Vigarista e Muttley não deixa escapar a essência do que já é conhecido dos personagens via televisão, assim como se permite, sem medo, criar possibilidades e origens para determinados conflitos ou, por exemplo, para a famosa Esquadrilha Abutre, rompendo nesse momento os próprios limites do quadrinho. Aliás, liberdade é uma identidade que acompanha os demais títulos da série de HQ’s lançada pela DC Comics e que são baseadas no universo dos desenhos animados do estúdio Hanna-Barbera.
“Quando se está combatendo a loucura, os loucos são os caras certos para o trabalho”
Publicada em 2017 nos EUA, Dick Vigarista e Muttley foi lançada pela Panini no último mês no Brasil, reunindo na mesma edição todas as seis edições da série original.